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Economia

Um salto na crise capitalista mundial

24/01/2008

A baixa de 75 pontos das taxas de juros pela Reserva Federal nos Estados Unidos no dia 22 de fevereiro, movimento que não se fazia desde 1984 e que foi realizado sem esperar a sua reunião prevista para o fim do mês, longe de ser um movimento magistral de seu atual presidente, Ben Bernanke, é uma mostra do desespero que percorre os altos círculos capitalistas e das finanças pela crescente crise capitalista mundial e assim foi interpretado pelos "mercados", que continuaram em queda. Esta terça-feira maldita seguiu a forte queda das bolsas do mundo na segunda-feira, com a débâcle mais importante das ações européias desde o atentado ás Torres Gêmeas em 2001. Estas quedas acionárias junto ás perdas recordes de bancos de primeira linha como o Citigroup ou Merril Lynch estão assinalando a entrada em uma nova etapa da crise.

Uma nova etapa da crise

O que demonstram estes acontecimentos bursáteis e financeiros? Primeiro, a recessão norte-americana é inevitável e já começou, e a mesma será muito mais severa que as suaves recessões de oito meses de duração de 1990-91 e 2001. Segundo, o resto do mundo não se descolou da economia dos Estados Unidos, pelo contrário a forte recessão norte-americana implica uma aguda desaceleração do crescimento global em 2008. Terceiro, uma dura recessão nos EUA terá pesadas conseqüências sobre os lucros das empresas. Quarto, que a agressiva política de corte das taxas de juros da Reserva Federal não evitará esta forte recessão e que os operadores terão que se acostumar a massivas perdas financeiras, como tem sido o caso dos grandes bancos de Wall Street, Citigroup e Merryl Lynch na semana passada.

Em outras palavras que quando os EUA espirram o resto do mundo se resfria, só que neste caso os Estados Unidos está tendo uma forte pneumonia. O começo de 2008 assinala a entrada em nova etapa da crise capitalista mundial.

As bases estruturais da crise

No último número da Estrategia Internacional dizemos que "Uma característica marcante do capitalismo contemporâneo é a recuperação da taxa de lucro desde o começo dos anos 80, e mais decididamente desde os anos 90 em diante; mas este processo não vai acompanhado por um aumento da acumulação capitalista durável e generalizada". Por sua vez, sustentamos que esta tendência inédita do capitalismo "se dá juntamente com uma tendência ã sobre-acumulação nos escassos nichos de valorização produtiva que encontra o capital em nível internacional.", que no último período tem sido as economias do sudeste asiático, e em particular da China, a região mais importante da economia mundial em termos de massa de mais-valia para a reprodução capitalista em nível global. Este país que emergiu como paradigma da nova divisão de trabalho internacional se beneficiou muitíssimo mais que outros países por sua vasta disponibilidade de mão-de-obra barata, da tendência das economias e multinacionais dos países imperialistas a baixar os custos para recuperar a rentabilidade depois da crise dos anos 70, tendência que se aprofundou como saída ao sobre-investimento dos anos 90 nos EUA, e ã crise recessiva que o acompanhou.

O resultado desta configuração do capitalismo contemporâneo e a fonte de seus desequilíbrios é "uma eficiência em recuperar o lucro, estreiteza do mercado mundial e a feroz competição capitalista". Em outras palavras, o "processo de reestruturação e relocalização capitalista das últimas décadas" tem como contrapeso uma tendência oposta, "a estreiteza do mercado mundial que não permite valorizar e realizar os níveis de taxa de lucro alcançados de maneira sustentável". Como sintetizamos na mesma revista, "poderíamos definir os últimos anos como um período florescente desde o ponto de vista da capacidade do sistema para rentabilizar o capital. Entretanto, a mais-valia assim obtida tem cada vez mais dificuldades para encontrar espaços de acumulação convenientes. Isso é por sua vez o reflexo de uma contradição agudizada entre produção e consumo, que está recriando nas últimas décadas as condições de uma crise de realização. Ao se estancar a renda dos assalariados o poder de compra declina, e o ritmo de fabricação se desconecta da capacidade de absorção dos mercados".

A atual crise norte-americana demonstra de forma patente estas agudas contradições do capitalismo contemporâneo. Os EUA têm sido a principal fonte dos desequilíbrios globais dos últimos anos: o massivo déficit de conta corrente absorve ao redor de 75 das poupanças excedentes mundiais, ou a mais-valia acumulada em nível mundial. Isso é a expressão das debilidades das fontes de acumulação do capital: a taxa neta de poupança cresceu meros 1.4% nos últimos cinco anos, o que implica que os EUA devem importar as poupanças excedentes do estrangeiro para seguir crescendo, isto é, deve atrair o capital externo. Daí a origem do massivo déficit de conta corrente e os déficits comerciais. A queda dos investimentos é expressão da debilidade da acumulação capitalista e da redução na renda dos assalariados que vem sendo reprimidas pela política de contenção salarial das corporações para restaurar o benefício implica a necessidade de impulsionar a demanda com uma crescente emissão de dívida, dando origem a uma economia que alguns autores denominam "ativo dependente". Neste marco se pode apreciar o papel para a economia de conjunto da chamada bolha imobiliária que veio se desenvolvendo desde 1997. Segundo cálculos sérios na última década, e apesar do boom bursátil, o lucro obtido pela venda e revenda das casas tem sido a principal fonte de enriquecimento patrimonial dos lares [1]. Mas com uma bolha seguindo a outra e no mercado de crédito barato, os desequilíbrios norte-americanos cresceram em proporções descomunais. Apesar da débil geração de renda o consumo privado cresceu a um recorde de 72% do produto interno em 2007. A dívida dos lares bateu um recorde de 133% da renda disponível e as medições das poupanças pessoais em função da renda entraram bateram marcas negativas em 2007. Como se vê estas tendências não se podem sustentar e são as que desde meados de 2007, e agora decisivamente, explodiram.

Características particulares da crise norte-americana de 2008

O que faz particularmente aguda a atual crise norte-americana é que esta combina uma tendência ã recessão com uma forte crise do sistema financeiro em si mesmo, em especial no coração do sistema financeiro internacional, os pesos pesados de Wall Street. Neste sentido, a recessão norte-americana de 2008 pode ser similar em qualidade - apesar de que não necessariamente em duração e profundidade - ã retração japonesa do início dos anos 90 que perdurou toda uma década, ou ainda da retração alemã no início da atual década, que a recessão norte-americana de 2001. Esta última foi curta, ajudada por uma importante queda das taxas de juros e um massivo estímulo fiscal, que se expressou na passagem abrupta de um importante superávit orçamentário a um forte déficit. Pelo contrário, a crise japonesa e alemã tiveram anos de baixas taxas de lucros antes que a economia real melhorasse.

Em 2001 o principal mecanismo de transmissão da queda das taxas foi o crédito imobiliário, que sustentou desta maneira a economia, evitando que a sobre-acumulação no setor tecnológico se transformasse em uma recessão aguda ou inclusive numa depressão. Além disso este impulso monetário chegou em um momento em que o mercado imobiliário já estava em ascenso, impulsionando-o a um boom descomunal, a "bolha imobiliária". As perspectivas inflacionárias eram baixas, pelo qual era um bom momento para tomar novas dívidas, como foi o caso dos EUA nos últimos anos. A atual recessão não pode ser mais diferente. Os preços das moradias estão caindo e podem seguir caindo fortemente até alcançar um nível sustentável com a demanda solvente. A taxa de inflação (4.1%) é a mais alta das últimas décadas. Não há maneira para que a Reserva Federal crie um novo boom imobiliário, ainda que quisesse. Muito menos de contrair novas dívidas, e de ainda por cima pagá-las. Neste marco, a queda dos preços da moradia tem uma dinâmica própria que não é fácil de mudar. Mais aguda ainda é a desvalorizarão do preço dos ativos e a fuga da dívida de conjunto dos agentes econômicos o que pode desencadear uma aguda « seca creditícia » e um círculo vicioso deflacionário.

Possíveis cenários para os EUA: o perigo de uma espiral deflacionista e a interrupção do crédito

A crise financeira implica uma retração do crédito, um processo que é altamente improvável que a FED possa deter. Entretanto, altamente improvável não necessariamente significa que seja totalmente incapaz. Bernanke, o presidente da FED, é um expert na Grande Depressão e sabe perfeitamente os perigos de deixar que o processo de retração creditícia se alimente a si mesmo. Ele e seus colegas farão todo o possível para evitar que um círculo vicioso se desenvolva. As injeções abertas e encobertas de liquidez aos grandes bancos como o Citi, ou as grandes firmas hipotecárias, nos meses passados tentam fazer com que o mercado de capitais (onde se negociam os bônus ou títulos, tanto públicos como privados) não tenham se declarado em bancarrota. Talvez a FED faça uso de medidas extraordinárias para manter o nível de confiança em uma escala razoável. Isso porque a confiança entre os grandes bancos (as tendências ã "guerra fria" como The Economist as chamou) e a vontade de outorgar crédito é o que realmente está em jogo.

A questão em última instância é que a brutal extensão do crédito foi mais além de níveis sustentáveis. A magnitude das perdas calculadas desde o início da crise tornam insustentável a continuação de qualquer esquema de postergação do default. Mas em que proporção? Esta é a grande pergunta. Um crack financeiro é uma possibilidade real. Alguns analistas calculam sua probabilidade em cerca de 30%. Ainda que este seja já perigosamente alto, não significa que possa ser prevenido. A FED tenta evitar esta calamidade e gerar em troca uma recessão verdadeiramente desagradável. A mesma significa que os assalariados de média e baixa renda deverão carregar o peso da crise. Mas desde o ponto de vista capitalista a alternativa é terrivelmente pior: uma deflação ã "japonesa" devido ã negativa de computar as perdas no valor dos ativos inflados.

O que está claro é que o pior está por vir. Já é evidente que a crise financeira já se estendeu para além do colapso das garantias do mercado hipotecário, como demonstram as previsões de perdas dos grandes bancos no crédito de consumo de tamanho similar ao mercado subprime. Outros segmentos de maior magnitude como os CDS [2] "...têm o potencial de causar um sério contágio financeiro. A crise subprime chegou bastante perto de desestabilizar o sistema financeiro global. Uma crise dos CDS sob um cenário pessimista, pode produzir um descalabro do sistema financeiro global" [3]. Para este analista a chave não é se os EUA podem evitar uma forte contração, senão mais importante é a duração desta. Um cenário otimista seria uma curta e pouco profunda desaceleração. Um segundo melhor cenário seria uma aguda, mas curta, recessão. Um cenário verdadeiramente horrível seria uma longa recessão, como as experimentadas pelos EUA no passado, por exemplo desde novembro de 1973 a março de 1975, ainda que por sorte naquele momento não havia um mercado de CDS.

Como vemos, a crise financeira já está afetando os pilares do capital bancário. Nos próximos meses evitar que este entre em um círculo vicioso no qual as ajustadas condições de liquidez, os baixos valores das ações, recursos de capital debilitados, uma reduzida oferta de créditos e uma demanda lenta se alimentem uma ã outra, será a grande prova que o sistema financeiro mundial terá que suportar.

Conseqüências para a economia mundial

No ano passado a maioria dos economistas e políticos sustentavam que a economia mundial poderia se descolar da desaceleração da economia norte-americana. Mas frente ã « aterrisagem forçada » que está acontecendo este debate se acabou. Se os EUA se encaminham a ter uma aberta recessão o resto do mundo não pode se descolar, e pelo contrário, irá experimentar uma séria desaceleração econômica também. O consumo norte-americano representa quase 9 bilhões de dólares, o chinês só um bilhão e o da Índia apenas 600 milhões de dólares. Por sua vez os consumidores da Europa e do Japão estão inconformados frente ã diminuição de seu poder aquisitivo e a crescente insegurança do trabalho os têm levado a poupar mais que consumir. Portanto, não há ninguém em condições de substituir os EUA como consumidor em última instância.

Neste marco a maior integração da economia capitalista mundial implica uma maior difusão de sua crise. Como dissemos na EI "..., a internacionalização do capital produtivo converteu quase todo o planeta em seu terreno de valorização, e tem sido um dos elementos essenciais que permitiu a recuperação da taxa de lucro. Por outro lado, também implicou em que os mecanismos de propagação e contágio das crises tenham se acelerado".

Estes vão desde os canais comerciais, financeiros, monetários, de investimentos e outros que transmitem os choques econômicos ou financeiros desde os EUA ás outras economias ao redor do mundo. Assim, no plano financeiro a crise do mercado subprime levou a uma ampla e muito severa crise de liquidez e de crédito na Europa, Austrália e outras partes do mundo, mediante a compra por investidores destes países de "securitized instruments" norte-americanos. Outro mecanismo de contágio financeiro segue sendo a dependência das bolsas do mundo dos resultados de Wall Street como tem se podido apreciar de forma eloqüente nos últimos dias. Desde o ponto de vista comercial uma recessão norte-americana e a conseqüente queda no consumo e no investimento das empresas leva a uma redução das importações norte-americanas.

Dado que os EUA têm um déficit comercial anual de 700 milhões de dólares anuais, o efeito de sua desaceleração é provável que seja maior que seu peso na economia global. (O PIB dos EUA representa cerca de 25% do PIB mundial). Isso é uma pressão fortemente depreciativa para alguns países altamente dependentes das exportações aos EUA, como Canadá e México, além de China, Japão, Coréia e uma parte significativa do resto da Ásia (Singapura, Hong Kong, Malásia, Filipinas e Tailà¢ndia). A China é particularmente vulnerável a uma recessão norte-americana devido a que grande parte de seu crescimento recente se apóia nas exportações, ainda que no último período a UE superou os EUA como seu principal mercado. Se os elos do recente ciclo de crescimento mundial, um pelo lado da demanda (EUA), e outro pelo lado da oferta (China), faz cair a demanda chinesa pelos bens intermediários, o resto da Ásia também cai, e também o crescimento destas economias.
É mentira que a maior inter-relação do comércio inter-asiático faz esta região menos dependente dos EUA. A realidade é que o surgimento da China como oficina do mundo tem transformado a muitos destes países em produtores de insumos - como os chips de computadores - que eles exportam para a China, e esta os embala e em seguida os exporta para os EUA ou Europa como mercadorias acabadas, por exemplo bens de consumo eletrônicos. Da mesma maneira a detenção dos dois motores da economia mundial nos últimos anos afeta a demanda de commodities - petróleo, energia, alimentos, materiais - e o preço de tais matérias-primas que têm carecido fortemente nos últimos anos devido ao forte crescimento da China e em certa medida da Índia e outras economias. Isso irá golpear especialmente os países semicoloniais da Ásia, América Latina e África. Por exemplo, o cobre chileno dependente de forma direta do mercado norte-americano e em forma indireta do mercado chinês pode cair.

Por sua vez, no terreno monetário a desvalorização do dólar que busca melhorar a competitividade das corporações norte-americanas é uma má notícia para todos os países que exportam aos EUA, que vêem encarecer seus produtos nos mercados norte-americanos, em particular isso afeta a UE devido ã forte valorização do euro e a conseqüente perda de competitividade de muitas de suas empresas.

Em outro plano, o estouro da bolha imobiliária dos EUA tem sido um sinal de alarme que desatou o começo do estouro de bolhas similares em outras partes do mundo, em especial no Reino Unido, Espanha e Irlanda de forma mais aguda.

Emergente deslocamentos do sistema monetário internacional

A agressiva baixa das taxas de juros nos EUA com o conseguinte perigo no imediato de aumento da inflação criou um risco de uma precipitada queda do dólar. Mas o surpreendente é que apesar de outras moedas como o euro ou o yen terem se valorizado nenhuma delas se converteu em moeda de substituição do dólar, senão que é o ouro que se aproxima dos mil dólares a onça quando a crise acaba de começar, o que segundo o Financial Times tem se convertido na "nova moeda global" Isso não é uma volta ao estrito padrão ouro que foi o sistema monetário internacional entre 1870 e 1913, ou o padrão câmbio ouro [4] que sucedeu a Segunda Guerra Mundial até 1971 quando foi abolido pelo presidente norte-americano de então, Nixon. Antes de tudo representa um emergente deslocamento do sistema monetário internacional no qual o ouro atua como refúgio universal do valor frente ã desvalorização de todos os demais ativos monetários ou financeiros.

Mas como dizia Keynes o ouro é uma "relíquia bárbara"... mais ainda na época das transações eletrônicas. Seu ascenso é sinônimo do nervosismo e da desconfiança que imperam nos altos círculos capitalistas.

Mas o dólar não é a única moeda com problemas. Martin Wolf, principal economista do Financial Times, assegura que a libra seguirá o mesmo caminho. A combinação de fortes déficits de conta corrente, enorme endividamento interno e o fim da bolha imobiliária estão acabando com os sinais de prosperidade dos últimos 15 anos, enquanto Londres tenta por todos os meios recuperar o prestígio perdido após a primeira corrida bancária em um país imperialista desde a Grande Depressão, como foi o caso de Nothern Rock, a sexta instituição financeira do Reino Unido. O grave que esta desvalorização da libra é que agrava os problemas do euro, já suficientemente apertado pela desvalorização do dólar e da crescente entrada de mercadorias baratas da China. Não nos esqueçamos que a Grã-Bretanha é a principal sócia comercial da UE.

Por sua vez o yen vem apreciando fortemente o que ameaça com desatar uma nova onda recessiva e deflacionista no Japão. Durante estes anos a existência de baixas taxas de juros neste país permitia a toda a sociedade financeira instalada em Tóquio, fosse japonesa ou filial de uma entidade estrangeira, aproveitar a diferença na remuneração do dinheiro em outras praças para comprar ativos financeiros a preços baixos. Este mecanismo chamado "carry trade" e a acumulação de reservas dos excedentes comerciais dos novos países industrializados da Ásia, em particular da China, assim como dos beneficiários de rendas energéticas como o petróleo ou o gás foram as principais fontes de crescimento incontrolável da massa de divisas ou de escrituras que usam como "moeda", que está detrás da perda do controle dos Bancos centrais sobre as variáveis que no passado estava dentro de seu âmbito poder controlar, como é a quantidade de moeda em circulação.

Isso tem podido se desenvolver por falta de coordenação internacional entre as principais potências imperialistas para regular estes fluxos, devido aos distintos interesses destas, e em particular dos EUA, interessados em não por a menor trava neste dinheiro com o qual financiam seus déficits e é a salvação que alimenta seu hipertrofiado sistema financeiro. Frente a estas perspectivas sombrias que se fecham sobre a economia mundial esta falta de coordenação se fará mais aguda, e pode ser a pedra de toque de crescentes tensões monetárias, sejam desvalorizações competitivas no caso da crise que se agrava, ou de crescentes medidas protecionistas.

Se há um lugar que paradoxalmente está a prova é a zona do euro. A crise atual põe ã prova esta criação monetária que carece de um governo unificado, e onde a crise econômica em curso pode colocar em destaque as importantes falhas que lhe são características, isso é: as crescentes dificuldades para manter sob um mesmo manto os países nórdicos, em especial Alemanha, cujo eixo é o perigo inflacionário e a solidez de sua moeda, e os países do sul da Europa, em particular Espanha e Itália, e em certa medida França, com fortes problemas de competitividade, de déficits comerciais, de galopante endividamento privado ou público que gritam por uma política menos restrita que a atualmente comandada pelo Banco Central Europeu. Ainda que não esteja nos planos de ninguém, a crise pode acabar com a principal conquista da UE: sua moeda única.

A interrogante chinesa

Em médio prazo a questão de se a presente crise desencadeou uma crise mundial, do tipo da de 1929, depende da Ásia em particular da China.

Esta região, a principal zona de acumulação do sistema capitalista mundial, vem desenvolvendo uma sobreacumulação de capital e uma conseqüente superprodução de mercadorias que excede muito as capacidades de absorção do mercado mundial. Até agora o super-endividado consumidor norte-americano atuou como consumidor em última instância desta super-produção, ao custo de agravar os desequilíbrios da economia mundial.

Este "equilíbrio dentro do desequilíbrio" se rompeu. Poderá a demanda chinesa substituir esta válvula de saída a sua sobre-capacidade produtiva, como esperam os capitalistas ocidentais? Difícil que este reordenamento interno se produza devido a que a orientação exportadora chinesa é resultado da relocalização da atividade produtiva dos principais grupos multinacionais dos EUA, Europa e Japão, e toda modificação deste curso significaria alterar gravemente seus interesses econômicos. Tampouco é provável que a grande maioria dos consumidores chineses que não contam como no passado com as conquistas sociais em educação, aposentadoria, moradia ("iron rice bowl [5]"), e que portanto agora devem pagar por elas se arriscam a deixar de poupar se lançam no consumo desenfreado, atuando desta maneira como substitutos do consumidor norte-americano.

Pelo contrário, o mais provável é que a crise norte-americana e a conseqüente desaceleração do comércio internacional golpeie fortemente a China, exacerbando suas crescentes contradições econômicas, políticas e sociais e sua forte desigualdade social e regional e a ascendente luta de classes tanto no campo como na cidade, pondo em questionamento o atual curso restauracionista da burocracia de Pequim. A grande festa dos Jogos Olímpicos de 2008 que ia converter-se na grande prova da entrada da China no cenário internacional pode de repente se tornar amarga. Uma agudização simultânea da crise chinesa e norte-americana seria um cenário de pesadelo para a economia mundial.

Um programa frente ã catástrofe que se avizinha

Os países capitalistas avançados, em especial os EUA e em certa medida a UE, que têm levado suas próprias dificuldades sobre seus competidores como foi o caso do Japão nos anos 80, ou descarregado sua crise na periferia, como demonstra a crise da dívida latino-americana em 1982, ou as sucessivas crises dos países chamados emergentes, não experimentaram nos últimos anos duras recessões, e ainda menos depressões. A atual crise, que tem seu epicentro nos EUA e que pode se propagar rapidamente em alguns países europeus como a Itália ou a Espanha, abre a perspectiva de crescimento do desemprego, e uma sustentada queda dos salários após décadas de crescimento. A imprensa patronal já exige de Zapatero que seja como Sarkozy, enquanto este apesar de seus avanços parciais lhe exige mais coerência em seu ataque ás conquistas operárias.

Nos países da periferia também significará um duro despertar para aquelas nações que sofreram duras crises na década passada, ou no começo desta, e que acreditaram salvar-se das contradições capitalistas com o boom das matérias-primas como é o caso da Argentina, Venezuela, México ou mesmo do Brasil, ou ainda a potência emergente da Rússia. Como dissemos, a China que se salvou da crise asiática de 1997-98 e que desde este momento começou seu crescimento, também será submetida a uma dura prova. Neste marco os trabalhadores e os povos do mundo deverão se preparar para fazer frente a catástrofes maiores, com milhões de desalojamentos, crescimento do desemprego, perda das poupanças dos setores das classes médias, perda do poder aquisitivo do salário, e da incapacidade de dar conta das necessidades básicas, sem falar do acesso ã educação, saúde, cultura, etc.

O último período de crescimento, o mais forte desde a década de 70, permitiu em nível mundial uma recomposição objetiva e limitadamente subjetiva da classe operária mundial, com a incorporação de milhões de novos trabalhadores que vêm tencionando seus músculos em combates de classe, tanto em países capitalistas mais avançados como França, Itália e ultimamente Alemanha, passando pela América Latina, o continente de vanguarda da luta de classes mundial até a recuperação da classe operária russa e polaca na Europa do leste e na ex-URSS, os trabalhadores sul-africanos, e por último a classe operária chinesa que para alguns observadores já está se convertendo em um emergente epicentro da luta de classes a nível internacional. A crise mundial porá a prova estes novos batalhões da classe operária, obrigando a avançar ao calor de golpes cada vez mais rudes que o capital está preparando. Apostamos no amadurecimento revolucionário do único sujeito que pode terminar com as crises capitalistas e suas catástrofes, misérias e guerras.

  • NOTAS
    ADICIONALES
  • [1Os lucros bursáteis (20%) ocupam a segunda posição.

    [2Os CDS , o credit default swaps, são instrumentos financeiros que permitem desligar o risco crediticio e negociá-lo separado. É um seguro que protege ao banco contra a perda derivada do não cumprimento dos empréstimos. Foi graças a eles que a bancarrota da Enron pôde ser contida. Mas em útima instância a solidez deste instrumento depende da magnitude das insolvências. E estas por sua vez dependem do estado da economia. O mercado dos CDS tem crescido enormemente nos últimos anos alcançando a marca de 45 bilhões de dólares, três vezes o produto bruto anual dos EUA

    [3Financial Times 13/1/2008

    [4Este é um sistema monetário pelo qual se fixa o valor de uma divisa em termos de uma determinada quantidade de ouro. O emissor da divisa garante poder devolver al possuidor de sus bilhetes, a quantidade de ouro neles representada. Este sistema se implementou em Bretton Woods, quando surgiu o Fundo Monetário Internacional (FMI). As divisas que garantiam o câmbio ao ouro foram o dólar e a libra esterlina. Este sistema deu lugar a uma estabilidade relativa de 1944 a 1971.

    [5Em inglês "iron rice bowl", nome que recebe a política maoísta, já praticamente extinta, de proporcionar casa, comida, e assistência a todo o povo chinês. Exemplo disso eram as fábricas, que contavam com habitações para seus trabalhadores e suas famílias, ademais de proporcionar-lhes alimento e um salário.

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