Lançamento da revista Estratégia Internacional Brasil 6
A crise capitalista e a necessidade da reconstrução da IV Internacional
15/11/2012
CICLO "POR QUE TROTSKY?"
No dia 8 de novembro mais de 120 pessoas dentre estudantes, trabalhadores e militantes de organizações da esquerda compareceram ao debate convocado pela LER-QI para discutir a crise capitalista e a necessidade da reconstrução da IV Internacional hoje. Esta atividade encerrou a primeira rodada do ciclo de seminário Por que Trotsky?, e lançou o sexto número da revista Estratégia Internacional Brasil 6, publicação da Fração Trotskista – QI, em português. A mesa foi composta pelos militantes da LER-QI Simone Ishibashi, socióloga e diretora da revista Estratégia Internacional Brasil 6, Gilson Dantas, da revista Contra Corrente e histórico militante trotskista, e Leticia Parks, estudante da USP perseguida politicamente.
A atividade se iniciou com a fala de Leticia Parks, que mediou o debate. Letícia faz parte dos 73 estudantes que foram presos no ano passado no exato dia 8/11, por lutar contra a presença da polícia no campus, política levada adiante pela reitoria de Rodas como parte de uma ofensiva repressiva contra os estudantes, trabalhadores e docentes que possam se opor aos seus planos. Hoje encontra-se, ao lado de diversos outros estudantes e trabalhadores que abarca inclusive os diretores do Sintusp, sob a condição de perseguida política. Letícia partiu de resgatar a importância do combate ã repressão aos lutadores, e ligou a situação que acontece dentro dos muros da universidade com a crescente perseguição e assassinato ao povo negro e pobre, que tem sido alvo de gatilho fácil bem próximo ã maior universidade de São Paulo, com a ocupação da favela São Remo. “ “ Nesse sentido, ressaltou como existe um pacto entre o governo federal e o governo do estado, que apesar das polarizações eleitorais coincidem em uma questão fundamental: em reprimir e impor o terror aos trabalhadores, jovens e todos os oprimidos que vivem nas periferias.
Em seguida, abrindo o debate, falou Simone Ishibashi, que partiu de remarcar que em seu quinto a crise capitalista começa a dar lugar a expressões políticas que demonstram que é uma crise que não pode ser entendida meramente como uma crise econômica. Assim, apontou que apesar de Barack Obama ter sido reeleito no dia anterior ao debate, o processo de decadência histórica da hegemonia norte-americana continuava em curso, e que se a crise aí parecia mais controlada se devia mais ao baixo nível de luta de classes, que a uma recuperação significativa da economia. Neste marco, a vitória de Obama se distinguia da sua primeira eleição, que fora marcada por um alto grau de ilusões, tendo sido favorecida também pelo perfil direitista das candidaturas do Partido Republicano.
Em relação ã Europa, epicentro da crise hoje, apontou que se depois de 17 greves gerais na Grécia, 4 no Estado Espanhol, e da luta dos trabalhadores e da juventude francesa contra as reformas da previdência de Sarkozy, e da greve dos mineiros espanhóis não se conseguiu responder ã altura dos ataques, é graças ao papel da burocracia sindical, que sistematicamente tem se negado a romper com a estratégia de lutas de pressão. Daí a necessidade imperiosa de levantar um combate duro contra a burocracia, e da esquerda e todos os jovens que despertam para a luta política em meio ã crise levantar um programa que possa fazer dos atos do 14N um momento chave para avançar neste sentido.
Do ponto de vista político, ressaltou como começam a se dar novos fenômenos para além do fortalecimento da direita, como a Frente Nacional de Marine Le Pen no período anterior, que se concretiza na refundação de novas mediações reformistas que buscam ocupar o descontentamento popular com os partidos tradicionais. Este conformam-se como partidos amplos ou coalizões entre reformistas antineoliberais e resquícios dos velhos stalinistas, que buscam ocupar o espaço eleitoral aberto pelo descontentamento de setores de massas com os ataques como forma de lidar com a crise capitalista.
“A primeira prova política para a esquerda internacional foi o Syriza grego. Esta coalizão que reúne cerca de 30 organizações dos mais distintos matizes dentre os quais figuram representantes do no-global, de setores stalinistas, reformistas de todos os tipos, nucleados em torno do Synaspismo, apesar de ter se alçado como uma alternativa ao PASOK não tem nenhuma ligação com a classe trabalhadora. Trata-se muito mais de um partido midiático, que um partido com capacidade real de mobilização. Entretanto, nada disso foi tomado em conta pelas organizações do centrismo trotskista, que rapidamente saíram a apoiá-los. Esta pode ser encarada como uma primeira prova política, que aponta a que em relação a estas novas mediações estes setores não estão dando um giro para reverter a sua deriva estratégica”, disse. Neste sentido, criticou o apoio dado pelas organizações que se reivindicam como trotskistas, como o Partido Obrero argentino, e o PSTU em nosso país, como uma política que rompe com o legado de Trotsky ao dar apoio eleitoral a um engendro reformista, em detrimento de uma política que faça avançar a independência de classe dos trabalhadores. Este mesmo teste não foi cumprido também frente ã primavera árabe, em que organizações como a LIT-PSTU saem a comemorar a queda de Kadafi na Líbia mesmo sob a atuação da OTAN rompendo com a política de defesa da queda revolucionária dos regimes árabes, de maneira independente do imperialismo e da burguesia. Terminou ressaltando a necessidade de nos apropriar do legado de Trotsky, não para repeti-lo dogmaticamente ou para dias de festa, mas para definir as posições corretas frente a estas novas provas da luta de classe internacional.
Em seguida Gilson Dantas interveio, resgatando como Trotsky era visto pela sua geração. Traçou um paralelo entre o trotskismo de sua geração, setentista, e o por quê da necessidade da ofensiva Trotsky hoje. Do trotskismo pela metade ou centrista, ao trotskismo de centralidade estratégica, foi seu tema. Ele ressaltou que em tempos do guevarismo, do maio de 68 na França, da revolução vietnamita em marcha, da marcha dos cem mil contra a ditadura no Brasil e onde afloravam revoluções pelo mundo afora, a figura de Trotsky se destacava, para além de sua figura épica, por sua relação indissolúvel com sovietes, com o partido bolchevique e com a Revolução Russa. Uma parte da juventude de esquerda encontrava, ao mesmo tempo, em Trotsky, o programa da revolução política e a explicação para o chamado “socialismo real”, a sociedade onde o capital foi expropriado mas o proletariado foi confiscado e subjugado no poder de Estado por uma burocracia parasitária.
No entanto o que existia em seu tempo era um trotskismo pela metade. Que abandonara parte crucial da sua bagagem clássica e se degradara no centrismo auto-proclamatório e, para nada, internacionalista.Todas as revoluções do seu tempo, de todo aquele ciclo fechado com a frustrada revolução política na Polônia em 1981, fracassaram. Nenhuma delas instaurou qualquer coisa parecida com a Revolução Russa, com um Estado operário que não nascesse deformado. Por outro lado, nenhuma delas partiu do legado da Revolução Russa ou dos quatro primeiros congressos da III Internacional de Lenin e Trotsky. E este foi o primeiro destaque na sua fala: hoje, quando surgem elementos de um possível novo ciclo revolucionário, o programa e a estratégia da IV Internacional, continuadores diretos da Revolução Russa, do partido bolchevique, mostram-se atualíssimos e incontornáveis para que a ofensiva proletária não desemboque em novas derrotas, no nosso século, atalho direto para a barbárie. Eram revoluções sem partido revolucionário, sem a centralidade operária como sujeito político e programático e sem a estratégia de luta pelo poder democrático da classe trabalhadora e seus aliados pobres. Dessa forma poderiam até ir muito longe – para além dos limites de suas direções pequeno-burguesas ou stalinistas – mas sua estratégia e seus instrumentos políticos não conduziriam ao triunfo sustentado da classe operária.
Esse vem a ser precisamente o vazio que somente pode ser preenchido pelas ideias, pelo programa de transição e pela estratégia da revolução proletária, legados diretos da IV Internacional de Trotsky. Em sua fala, ele procurou mostrar a deriva e os atalhos estratégicos do trotskismo do pós-Guerra, seus elos débeis de continuidade com Trotsky, sua adaptação a quaisquer aparatos de massa que surgissem e, em consequência, sua conformação centrista, ambivalente, dual. E a miséria da estratégia do atual trotskismo, amplamente explicado no informe da Simone. O que nos leva, com toda premência dessa nova época, ao debate Trotsky e ao resgate de sua experiência teórica clássica para condições novas. Mas que ainda que novas, se dão nos marcos de um tempo histórico que ainda é o de Trotsky, de crises convulsivas que rapidamente podem por a revolução na ordem do dia, assim como guerras de grande porte.
Trotsky é atual hoje porque a revolução não avança de qualquer jeito e nem com qualquer estratégia. A revolução é mundial, o partido é mundial, e assim como a burguesia tem sua estratégia, nós apenas avançaremos com direções proletárias e revolucionárias que conheçam estratégia, programa e estejam focadas no objetivo de um poder político onde o sujeito seja a classe trabalhadora. Foi explicado porque aquele trotskismo se degradou. E quais são as características de um trotskismo que ao mesmo tempo em que evolua para compreender os novos fenômenos da luta de classes – explicados na intervenção da Simone – e se funda com a nova vanguarda operária, mas também seja capaz de não começar do zero; ao contrário, que se funda com o legado revolucionário e estratégico de Trotsky.