Una nova fase da crise
Europa do Leste: ás portas de uma crise regional?
06/11/2008
A crise da Hungria, que nas últimas semanas sofreu uma forte queda de seu mercado de ações, um forte aumento das taxas de juros, o esmorecimento de sua moeda e a carência de liquidez de suas instituições financeiras, está hoje em dia no centro das pressões financeiras que agitam os países semi-coloniais e dependentes. a possibilidade crescente de uma crise como a da Argentina em 2001pode desencadear um efeito contagioso regional em todos os países da Europa do Leste e as repúblicas da ex-URSS, que agrave a crise financeira e a recessão em curso nos grandes países imperialistas, especialmente para a Europa Ocidental, cujas multinacionais utilizam essa região como base de produção a baixo custo.
A perspectiva de uma profunda instabilidade econômica, política e social. nessa zona, até agora relativamente calma desde o começo da restauração capitalista no começo da década de 90 (com exceção dos Balcãs e das ex-repúblicas soviéticas), pode obrigar ã União Européia a encarregar-se da pesada tarefa de gerenciar as tensões que provêem de seu quintal dos fundos, como já foi o caso da curta guerra entre a Rússia e a Geórgia frente ao vazio de liderança norte-americano.
A crise da Hungria, junto a vulnerabilidade financeira do Paquistão, Turquia, Indonésia e inclusive de países mais importantes como a Coréia do Sul, mostra que os chamados "países emergentes" podem ser o próximo elo agudo da crise capitalista mundial em curso.
Hungria: uma profunda estrangeirização da economia
A crise da Hungria pode ser familiar por que se trata da crise de um modelo muito similar ã Argentina durante a década de 1990. Acontece que diferente da Ásia, depois da crise de 1997-98, do default russo em 1998 ou da crise do Brasil em 1999 e o default da Argentina em 2001, esse países continuaram aplicando basicamente as receitas e postulados do "Consenso de Washington" de privatizações, abertura da economia e desregulação.
A Hungria tem sido o paradigma desse processo na Europa do Leste. Antes da mudança de regime em 1989, 65â…œ do comércio da Hungria era com os países sob a órbita da burocracia de Moscou, o chamado Comecon. Até o final de 1997,a Hungria já havia re-dirigido a maior parte de seu comércio para o Ocidente, em especial a Alemanha. As companhias multinacionais tem sido um fator central dessas transformações.
Na Hungria, o peso do capital estrangeiro na indústria é dos mais altos do mundo (cerca de 65%). Isso se deve, por um lado, ã privatização direta de companhias que anteriormente estavam nas mãos do Estado e, por outro, a grande quantidade de novos investimentos que as empresas multinacionais realizaram.
Nos dias de hoje, dois terços das exportações húngaras são manufaturas industriais (carros, máquinas, acessórios, etc), o que se deve principalmente ã atividade dessas companhias. Além disso, a Hungria abriu quase todos seus setores aos investidores estrangeiros, incluindo o banco, as telecomunicações, energia (produção e distribuição de energia elétrica e distribuição de gás) e água. Os bancos são 85% de propriedade estrangeira, majoritariamente bancos austríacos, alemães e italianos. Se essas transformações o localizam como um dos países mais "sólidos" da região segundo os falsos especialistas, o giro brusco do cenário econômico internacional, em especial as dificuldades de financiamento externo do qual dependia, realçou todas as suas vulnerabilidades. Em primeiro lugar, uma balança de pagamentos cronicamente deficitária, resultado do peso das multinacionais na economia. Essas orientaram a economia ã exportação, mas também são as maiores importadoras. De fato, as importações têm aumentado junto ás exportações, mas mantendo-se sempre por cima da renda por exportação. Ou seja, a economia transformou-se em uma mera mediação utilizada pelas grandes multinacionais da Europa Ocidental para terceirizar crescentemente sua produção. Por sua vez, essas grandes empresas têm desfrutado também de excessivas isenções fiscais. Em impostos sob a produção, essas empresas pagam só metade do que devem pagar as empresas nacionais. Ao mesmo tempo, também recebem do governo generosas ajudas em matéria de infra-estrutura (parques industriais, estradas, etc) e inclusive transferências econômicas diretas. Algumas estimativas dizem que o governo financia até 20% de seus investimentos. Resultado: um déficit fiscal exorbitante por mais planos de ajuste que venha aplicando.
Essas fortes vulnerabilidades foram suavizadas parcialmente há muito pouco tempo pelo financiamento externo (com o subsequente aumento da dívida tanto interna quanto externa) e pelo desenvolvimento de uma bolha imobiliária e creditícia que permitiu impulsionar o crescimento baseado no crédito hipotecário na moeda estrangeira, ao mesmo tempo em que o consumo e os gastos das companhias. Esses dois elementos, junto a seus problemas estruturais, agora são o calcanhar de Aquiles de sua economia.
A festa acabou
A Hungria, como outros países da Europa do Leste, vem vivendo para além de seus meios (qualquer semelhança com a convertibilidade na Argentina não é mera coincidência, já que é o mesmo modelo só que parcialmente suavizado nesse país pela existência de uma extraoridnária renda agrária). As vulnerabilidades que se acumularam, presentes há anos e inerentes a seu modelo econômico desenhado pelas multinacionais e a penetração imperialista, são custosas: um importante déficit comercial de 5% do PBN, um ainda forte déficit orçamentário de 5,5% do PBN (o que é uma melhora da situação comparada com dois anos atrás), uma moeda parcialmente supervalorizada, uma baixa quantidade de reservas externas e um alto nível de dívida em moeda estrangeira de curto prazo em risco de vencimento. Além disso, o crescimento da Hungria é o mais baixo de toda a Europa do Leste. o PBN real cresceu 1,3% em 2007, abaixo dos 4% do ano anterior, em grande parte devido ás medidas de austeridade implementadas em 2006.
Nesse marco estrutural, a crise financeira internacional pôs fim ã festa, empurrando o país a uma carência de crédito e liquidez e ao risco de um repentino de uma paralisação e êxodo do fluxo de capitais externos. Para frear essa drenagem, o Banco Central Europeu (BCE) e o Banco Central da Hungria acordaram facilitar liquidez em euros mediante um acordo de transações que permite ã entidade húngara pegar emprestado até 5 bilhões de euros. Que o BCE haja realizado um resgate de um país que ainda não é membro da eurozona é algo muito significativo e assinala a preocupação dos membros da eurozona com os efeitos desestabilizadores de uma crise na Hungria. Outra prova dessa situação comprometida é que a Hungria subiu 3 pontos a taxa de juros. Levemos em conta além disso, que a oferta de liquidez do BCE, diferente dos empréstimos do FMI, não tem fortes condicionamentos.
A principal debilidade da Hungria e de grande parte dos países da Europa do Leste, junto a sua inserção produtiva ultra-subordinada na economia mundial capitalista, é que a estrangeirização abusiva de seu sistema financeiro o faz depender no atual momento da crise da vontade dos bancos em continuar financiando sua economia, em um momento em que esses estão fortemente apertados em seus próprios países. Por exemplo, o austríaco Raiffeisen Bank e os alemães Volksbank y Bayerische Landesbank decidiram frear seus empréstimos em francos suíços e dólares. Esses empréstimos constituíam uma forma de "carry trade", isso é a tomada de empréstimos pelos bancos e as entidades financeiras em moedas de países com baixas taxas de juros como o yen japonês ou o franco suíço, e depois oferecê-lo a clientes em países com altas taxas de juros como a Hungria (ou ao menos mais altas em relação ao yen ou ao franco suiço). Se se desata uma crise como a atual e a moeda na qual o emprestimo foi outorgado se deprecia com relação ao yen ou ao franco suíço, então o credor (ou prestatário) está em apuros. O colapso da Islà¢ndia foi, em grande medida causado pelo "carry trade" em que os bancos islandeses estavam altamente comprometidos, como intermediários do "boom" do mercado imobiliário em boa parte da Europa. A Hungria, apesar de algumas comparações nesse sentido, não está sofrendo algo similar ao colapso da Islà¢ndia porque os bancos húngaros não eram intermediários do "carry trade". No entanto, a Hungria era um destino importante do mesmo. Desde 2003, o mercado imobiliário húngaro experimentou um forte influxo de empréstimos hipotecários em francos suíços, a miúde oferecidos pelos bancos internacionais que dominam seu setor bancário. Desde 2006, quase 80% de todas as hipotecas na Hungria foram realizadas em francos suíços. Na realidade, cerca de 60% de todas as hipotecas e empréstimos pessoais na Hungria no final de 2007 não eram em moeda local, enquanto que os depósitos em moeda estrangeira davam conta de 20% do total de depósitos. A queda do florim, a moeda húngara, significa condições mais duras para aqueles que contraíram dívidas em francos suíços ou euros; é que os que requerem créditos tinham sido atraídos pelas baixas taxas de juros, ignorando o risco cambiário. Esses elementos, combinados com a enorme relação empréstimos-depósitos superior a 140%, sugere uma forte dependência do financiamento externo no depositado, que tende a ser especialmente volátil no contexto da atual crise financeira internacional. O risco de que os investidores se neguem a continuar financiando a dívida ou que as casas matrizes dos bancos dos bancos estrangeiros reduzam a exposição a suas subsidiárias húngaras e - em uma situação de crise extrema - ainda deixar que algumas dessas subsidiárias quebrem (como alguns bancos norte-americanos fizeram na Argentina em 2001) podem afogar a economia e desatar uma crise de grandes proporções. Já algumas importantes empresas, como a maior fábrica de fertilizantes, Pétfürdoi Nitrogénmüvek, anunciaram que detêm sua produção durante quatro semanas devido ã crise financeira internacional, seguindo muitas empresas menores que já suspenderam suas atividades.
Europa do Leste e repúblicas da ex-URSS: A "crise asiática" de 2008?
Mas as vulnerabilidades da Hungria não são a exceção, mas a regra na Europa do Leste e nas ex-repúblicas soviéticas. Vamos de mal a pior. Polônia, a República Tcheca e a Eslováquia estão em melhores condições que a Hungria, já que evitaram o maior gasto estatal desse último (antes que começasse a ajustar seu pressuposto em 2006). Os tchecos, com baixas taxas de juros locais, não tem a pesada carga de empréstimos bancários em moedas estrangeiras que tem a Hungria. Mas assim como esta, esses países estão expostos a outro duro giro:uma forte queda de suas exportações ã Europa ocidental. A Eslováquia, com sua alta dependência de uma só indústria - automotriz- é altamente vulnerável. Mesmo na Polônia, onde o primeiro-ministro, Donald Tusk, insiste que seu país é uma "ilha de estabilidade", a crise gerou dúvidas sobre os planos da Varsóvia de entrar no euro.
Contudo, exceto pela Hungria, os banqueiros estão menos preocupados pela Europa Central que pelos estados bálticos e pelo sudeste Europeu. O crédito fácil, do qual gozaram os países bálticos desde sua entrada na União Européia em 2004, criou uma bolha imobiliária e uma forte inflação e déficit de conta corrente. Na Estônia, o crédito doméstico passou de 51% em 2003 para 95% em 2007 do PBN, enquanto a dívida externa líquida quase duplicou a 112% do PBN. Como na Hungria, o sistema financeiro dos países bálticos está centralmente nas mãos dos bancos suecos. O Swedbank, que tem mais clientes na região que na Suécia, tem visto suas ações caírem pela metade esse ano devido a sua exposição nos países bálticos. O "boom" já começou a se reverter desde o final de 2007 empurrando a Estônia e a Letônia ã recessão, a primeira na região em uma década. A Lituânia não está muito atrás. Outras das repúblicas da ex-URSS que se prepara para seguir a mesma rota é o Cazaquistão, país rico em petróleo. No sudeste europeu, a coisa também está complicada. O déficit de conta corrente da Hungria é alto, mas nada comparado com os déficits de dois dígitos da Bulgária, Romênia ou outros países bálticos. O problema mais agudo no primeiro é a alta dependência dos fluxos externos para seu financiamento. A economia sérvia se debilitou rapidamente nas últimas semanas. Por sua vez, a convertibilidade dos países bálticos e da Bulgária está na mira dos especuladores.
A Ucrânia, por sua importância, merece um parágrafo a parte. Esse mês houve uma corrida de pânico contra os depósitos. O governo já se encarregou do banco Prominvestbank, suspendendo o pagamento a seus credores. A queda dos preços dos grãos e do aço piorou as coisas, golpeando as duas exportações chave do país. Zaporizhtal, MML Steel, e Donsetsk Steel, todas estão reduzindo sua produção. Essa crise se dá por sua vez no marco da forte disputa política entre os outrora aliados da coalizão laranja: o presidente pró-ocidental Viktor Yushchenko, e a primeira- ministra Yulia Tymoshenko, que depois da guerra contra a Geórgia vêm se inclinando para a Rússia. Essas crescentes tensões levaram a dissolver o Parlamento e ã eleições antecipadas que podem inclinar a balança decididamente contra o Ocidente.
Os analistas do Citigroup põem a Romênia e a Bulgária junto com os bálticos, a Hungria e a Ucrânia como países vulneráveis a "um risco a sua estabilidade financeira" ("The east is in the red", Financial Times 16/10). Por isso, se a Hungria entra em colapso, o efeito contagioso para toda a Europa do Leste e as repúblicas da ex-URSS seria devastador - como a crise de 1997 no sudeste asiático que se expandiu da Tailà¢ndia a Malásia, Indonésia e Coréia e com seu impacto nos bancos japoneses e a economia nipônica -, questão que vínhamos anunciando desde o início da crise financeira em 2007. Muitos desses países já estão sofrendo significativas pressões financeiras como é o caso da Estônia, Letônia, Polônia, Romênia, Bulgária e Ucrânia. O FMI, que estava desaparecido, foi tirado de seu ostracismo frente a grave crise que enfrenta essa região, está negociando com a Ucrânia um empréstimo "stand by" (lembram-se?) para estabilizar seus bancos. A Sérvia é outro país que poderia necessitar de uma forte ajuda dos organismos internacionais.
Globalmente, depois da crise financeira aberta em agosto de 2007 e ainda não encerrada, a recessão já em curso nos EUA e nos principais países da Europa ocidental e no Japão, a crise da Hungria e seu contágio ã Europa do Leste e as repúblicas da ex-URSS podem assinalar a entrada da terceira fase da atual crise capitalista mundial, que vai afetar duramente ás economias dos países semi-coloniais e dependentes (chamados comumente pela imprensa "países emergentes") e que provavelmente em não muito tempo se desenrole fortemente nos "emergentes" asiáticos e latino-americanos. A situação do Paquistão, aliado do Ocidente em sua guerra contra o terrorismo, buscando desesperadamente na China um empréstimo para sua economia em ruínas parece confirmá-lo.
Traduzido por Beatriz Michel