Brasil
Veja, liberdade de imprensa e os interesses da classe trabalhadora
26/10/2014
Veja, liberdade de imprensa e os interesses da classe trabalhadora
A menos de 48h das eleições, o país foi sacudido por uma nova denúncia do escândalo de corrupção da Petrobrás. Segundo a Veja tanto Dilma como Lula sabiam dos esquemas de corrupção, segundo um informante da revista na delação premiada (em segredo de justiça) do doleiro Youssef. Com esta denúncia correndo as redes sociais e principais meios de comunicação, a campanha de Dilma alterou sua última inserção na TV para atacar a revista do grupo Abril, dizendo que irá responsabilizá-la judicialmente.
O PT entrou com medida no TSE pedindo a suspensão da circulação da revista por calúnia, o que o TSE já negou. Dilma e sua campanha já anunciaram que tomarão outras medidas judiciais. Nas redes sociais cresce, entre os setores progressistas (para além do petismo habitual e dos adesistas de último momento) gritos por fechar a revista entre outras medidas.
Por mais odiosa que seja a Veja, suas capas, seus artigos e seus articulistas, este tipo de medida, ao contrário do que a resposta emocional aponta, restringir a circulação da imprensa, ou mesmo restringir a liberdade de imprensa no Estado burguês é contrário aos interesses da classe trabalhadora, como discutiremos no final deste artigo.
Uma rede de dutos de corrupção que atinge todos, PT e PSDB
O caso Petrobrás, quente nestas eleições, é seguramente um dos maiores esquemas de corrupção a ser denunciados em nosso país. Nem Dilma nem o PT negam a potencial veracidade e alcance deste esquema. A candidata ã reeleição admitiu a existência do esquema e tomou o mérito da publicidade a seu governo e um suposto combate ã corrupção, e aproveitou o ensejo para trazer a público o que foi relatado – em caixa baixa no Globo, etc – que o PSDB também teria recebido do mesmo esquema. Esta denúncia inexiste na Veja, óbvio.
A maior empresa do país, é desde o tempo dos militares tanto um alvo para corrupção e enriquecimento ilícito como também instrumento para projetos políticos-pessoais. É assim que refinarias são instaladas em determinado estados, municípios e não em outros. Há corrupções e corrupções. Há as “ilegais” deste esquema como também as corrupções “legais” que envolvem escolhas políticas irracionais do ponto de vista de racionalidade no uso dos recursos.
Seguindo a denúncia de Youssef (o doleiro) e a Veja temos Dilma e Lula implicados. Seguindo um funcionário dele, Meirelles (denuncia pequena do Globo durante a semana), o PSDB também estaria envolvido, na figura do falecido presidente do partido, Sérgio Guerra, e do senador Álvaro Dias. E dos vazamentos de informações de Costa (ex-diretor da Petrobrás) há inúmeros envolvidos que não estão aparecendo porque se aparecessem o caso deveria sair da justiça do Paraná e ir ao STF já que atingiria políticos com foro privilegiado e só cabe ao supremo investiga-los.
Aí já aparece uma primeira dúvida crucial nas denúncias tanto do PT por um lado como do PSDB-Veja do outro. Se nestas delações premiadas os delatores estão proibidos de mencionar políticos com mandatos como pode o PT ter acesso a denúncias envolvendo Álvaro Dias, e do mesmo modo como pode o PSDB e a Veja ter acesso a denúncias envolvendo Dilma? Há algo de muito podre nos últimos andares da sede da Petrobrás na Avenida Chile como nas redações destes jornais e revistas.
E o que está podre atinge, seguramente, todos os grandes partidos do regime e todas grandes empreiteiras. Entre os modelos de privatização do petróleo em discussão (concessão com Aécio, e mistura de concessão para todas as áreas e partilha para o pré-sal com Dilma), não cabe aos trabalhadores tomar lado em quem privatiza “menos”. O mesmo vale para descobrir a verdade nestes esquemas. Não será das mãos nem do PT nem muito menos do PSDB e da Veja que a verdade será conhecida.
A Veja de 24/10 honra sua história
A Veja, revista de maior circulação do país, adiantou sua edição semanal do habitual fim de sábado a começo de domingo para esta sexta-feira de manhã. Nela expõe já na capa “eles sabiam de tudo”. Em O Globo de hoje, o “imortal” Merval Pereira já articulou a linha que também já consta na mesma Veja que nem ainda estava nas ruas, mas já estavam em uníssono nos dois órgãos: caso eleita Dilma precisa sofrer “impeachment”.
A edição em questão desta revista nada séria, tem dois temas principais: eles sabiam e água. E uma terceira matéria de destaque tem como objetivo mostrar mentiras de Dilma (e nenhuma de Aécio). Na matéria de capa expõe-se em várias páginas algo que teria sido dito em uma frase “eles sabiam”, e toda a matéria trata com um rigor “se for comprovado”, e expressões do estilo, o que dificulta a tese petista de calúnia.
Evidentemente trata-se de buscar influir na eleição mas, espertamente, a revista, coloca nos textos condicionantes que ela não coloca na capa. Além desta matéria central e a impressão adiantada também é chocante como esta revista consegue dedicar mais de 10 páginas ao tema da água e nele não gastar nem um parágrafo para tratar o problema paulista e sequer menciona a responsabilidade tucana de Alckmin no assunto. A revista é uma peça de raro jornalismo do começo ao fim. Digna de sua postura em toda a história.
Qual o programa dos trabalhadores frente ã mídia reacionária?
Não é uma novidade brasileira que governos que representam alas das elites (o próprio Lula declarou recentemente que os latifundiários deveriam ser gratos e votar Dilma) sejam atacados por outras alas da mesma elite. E sob este ataque estes governos voltam sua atenção aos meios de comunicação, foi assim na Venezuela, na Argentina, no Equador.
Em nosso país, onde é moeda frequente estas manipulações da mídia, uma das únicas condenações que já ocorreu foi dirigida aos sindicatos por fazerem campanha (caso da CUT por Dilma neste ano – enquanto as empresas, como o grupo Abril, podem livremente fazer campanha) e no campo partidário um dos únicos condenados neste tema foi um partido operário: o PSTU pela campanha de cartazes que associava Cabral a Hitler (comparação descabida, mas isto é outro tema). Se fosse aprovada alguma lei, alguma jurisprudência, que permitisse fechar os órgãos “inimigos”, seguramente, esta medida se voltaria rapidamente contra os trabalhadores e seus órgãos, como também pode-se mostrar nos países vizinhos.
Este tipo de problema envolvendo como se posicionar contra órgãos odiosos e reacionários é sequer uma novidade em nosso continente. O revolucionário russo Leon Trotsky, quando estava exilado no México, discutiu a campanha que sindicalistas e o PC mexicano estalinizado faziam pelo fechamento de alguns jornais críticos ao presidente Cárdenas. Naquela ocasião Trotsky argumentava que “tanto a experiência histórica como teórica provam que qualquer restrição da democracia na sociedade burguesa, é, em última análise, invariavelmente dirigida contra o proletariado”.
A luta da classe trabalhadora não passa por fortalecer o Estado que infiltra-se em greves (Jirau), manifestações (inúmeras), que some com negros (Amarildo) e a dar-lhes meios a nos reprimir, mas para erguer nossos órgãos de informação e apoderar-se dos instrumentos físicos (imprensas melhores, redes de comunicação, etc) em mãos da burguesia, para democraticamente, os trabalhadores produzirem e difundirem sua própria mídia. É preciso criar um “leninismo” do século XXI.
A batalha pela informação e opinião é uma que o PT sempre renegou. Uma esquerda que faça experiência com o PT, além de superar sua conciliação entre trabalhadores e burgueses, também terá que superar seu menosprezo pela luta para que nossas ideias cheguem as massas não de eleição em eleição, mas minuto a minuto ao toque do whatsapp e das novas e velhas tecnologias. Um passo neste sentido é o grande esforço que os companheiros do PTS estão dando ao impulsionar o primeiro jornal diário da esquerda latino-americana, o www.laizquierdadiario.com. Parafraseando o manifesto comunista, não será das mãos do estado burguês que virá nossa libertação da Veja e outros meios reacionários, mas será nossa própria obra.